O número 20 é o meu predileto. O da sorte, se acreditasse em
forças cósmicas capazes de alterar o destino de um vivente. A conjunção 20-20,
então, nem se fala, pois, entre os signos que povoam a minha cabeça, representa
a memória afetiva de duas pessoas de nome Vingt, palavra francesa que justamente
significa “20”.
Dessa maneira, quando escrevo 2020, desejo feliz 2020, faço
planos para 2020, preocupo-me com 2020, o inconsciente projeta não uma imagem, não
um ciclo, mas um sentimento. Ou seria o conjunto caótico deles? Não arrisco
traduzir em palavra. Sei apenas que me tomam as memórias de 20, meu avô; e de
20, meu irmão.
De súbito, eu, descrente, ouço vozes de outro mundo. A voz do
meu avô, ensinamentos que ainda hoje tento seguir à risca. A voz de meu irmão,
lições de generosidade tão fortes, tão dele, que, francamente, nunca me senti à
altura. Tudo ao mesmo tempo, como na letra de Antônio Maria, “uma voz, como um
homem só”.
Não menos de repente, o abraço vigoroso, tradução corpórea da
ternura. E do abrigo. Vêm aromas e sabores, aventuras na Mororó, brisa em
Tibau, refúgio na Dionísio Filgueira, meninice no Rabo da Gata. Mulheres. Ah,
meu avô! Ah, meu irmão! Gerações muito distantes, inalcançáveis, homens muito
parecidos em mim.
Bora lá, 2020! Reage logo, criatura! Vê se mostra a cara
antes do Carnaval! E, puta que pariu, faz favor de ser bom do começo ao fim. Nem
precisa ser ótimo, basta honrar a simbologia, porque, acima dos búzios, do tarô,
das bolas de cristal, do zodíaco, da numerologia e de todos os salamaleques, governam
as predições do afeto.
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