Todo mundo parou, olhando-me com ar de repúdio. A mulher tinha razão, mas ao mesmo tempo não tinha, de dar aquele grito medonho e injuriante: “Imbecil!”. Sem querer fugir à responsabilidade pelo lamentável ocorrido, asseguro que era impossível evitar que uma das rodas do carro caísse num entre os trilhares de buracos da tábua de pirulitos em que se transformou a Mossoró da Gente.
O trânsito frenético das 7 horas, a chuva forte, os vidros embaçados do veículo, as crateras nas ruas. O universo conspirava contra mim e contra a moça de bicicleta. De qualquer modo, os pingos de lama causaram-lhe mais irritação – pelo susto! – do que estrago nas roupas. Também estou ciclista, forçado pelo excesso de banhas e de lipídios, e quase sempre passo por situações semelhantes.
Na atual conjuntura, o melhor motorista não consegue se livrar da buraqueira, pois se o sujeito desvia de uma boca-de-panela cai em outra. Ou em outras. E convenhamos, desviar, dependendo do momento, a exemplo daquele em que acabei ouvindo o desaforo, pode piorar as coisas em consequência do risco de acidente, algo corriqueiro nas áreas críticas, como demonstram os noticiários.
A culpa é do inverno, dizem os representantes do Palácio da Resistência, tentando justificar o porquê de o asfalto da cidade se derreter com qualquer neblina, feito Sonrisal. Se pelo menos a pavimentação de nossa amada e idolatrada Terra de Santa Luzia tivesse propriedades medicinais, poder-se-ia dirimir o mal-estar dos cidadãos com dois ou três copos de betume diluído na água da chuvarada.
Tá na cara, só não vê quem não quer, quem é pago para não ver e quem anda com a vista prejudicada pela paixonite partidária: a culpa é do poder público, por não fiscalizar adequadamente as suas obras, permitindo que as gatinhas e gatonas reduzam a qualidade dos materiais e serviços para aumentar os lucros e a força de convencimento político. A natureza é inocente e eu não sou tão imbecil.