sábado, 20 de julho de 2013

Bolseta Família


Um membro duro da sociedade baiana tentou pagar uma garota de programa com o cartão do Bolsa Família, em Itapetinga, cidadezinha de aproximadamente 70 mil habitantes situada a 500 e tantos quilômetros de Salvador. Aflita e se sentindo lesada, a profissional do sexo pediu ajuda aos funcionários do motel, aos berros de "Golpe! Golpe!".

O sujeito não fez por maldade, estava precisado, a perigo, matando cachorro a grito. A moça, no entanto, esclareceu que sua maquineta não serve nem para passar cartão de crédito, quanto mais de programa social do governo; e que o bacalhau, a exemplo da sacanagem que fizeram com o camarão, foi vetado enquanto possível ingrediente da cesta básica.

Não adiantou o caboclo mencionar o caráter educativo do ato, as posições ideológicas do Kama Sutra e a eficácia fisioterápica dos alongamentos noturnos. Estado de necessidade, legítima defesa, protesto contra o orgasmo supostamente fingido pela jovem, a irresignação do povo brasileiro, nada sensibilizou a interlocutora.

O recepcionista do motel, na dúvida quanto aos honorários da trabalhadora e na suspeita de que o estabelecimento ficaria no prejuízo, chamou a Polícia Militar, que, de pronto, mandou guarnição ao local. O camburão teria entrado no estabelecimento,  com sirene ligada e luzes vermelhas piscando, só para criar aquele clima fetichista.

O herói da história ainda pediu que experimentassem seu Cartão do Cidadão, aquele emitido pela Caixa Econômica para a galera consultar saldos e sacar FGST, PIS, seguro-desemprego, abono salarial, essas coisas. A dona, contudo, revelando-se antenada com as transações - bancárias! - cortou-lhe o barato sem dó nem piedade: "Na poupança não entra!".

Sobrou para o som do carro, empenhado como garantia do pagamento das duas despesas, instante em que o membro da classe operária, ainda rijo, partiu em busca de socorro financeiro. Normal, tenho notícias de amigos que, além do insucesso nas projeções, precisaram deixar relógio, celular e pneu de estepe como caução do todinho.

Não se ria, meu amigo, pois a coisa é gravíssima, virou matéria na Folha de S. Paulo, e com destaque. Até a gloriosa Polícia Civil entrou no caso com unhas e dentes. O delegado quer explicações urgentes sobre o fato de os militares não terem formalizado a ocorrência nem prendido o meliante, autor da tentativa sabe-se lá de quê.


Espera! De repente, cai-me feito farelo de telha no cocuruto, um baião das antigas: "Tem mala, malinha e maleta/ Tem bolsa, bolsinha e Bolseta". Elementar, meu caro, o crime do indigitado está em recriar um diminutivo que a sabedoria popular acata, mas o dicionário não reconhece. Delito gramatical: Tem Bolsa, Bolsinha... e Bolseta Família.


Um comentário:

Cláudio Palheta Jr. disse...

kkkkk muito bom, digno das matérias da Piauí. Inteligente e sagaz