sábado, 18 de outubro de 2008

A professora



Os rapazes iam ao delírio. Corações palpitantes, mãos frias, pernas tremendo, suspiros, pensamentos em voz alta. Tudo isso por causa da professorinha que atravessava o corredor azul-marinho da escola, flutuando em passos macios de generoso gingado, até romper o umbral da sala de aula, distribuindo bons-dias perfumados com o aroma daquela boca pequena, enfeitada em tom delicadamente vermelho.

A turma retribuía o cumprimento - “Bom-dia, fessora!” -, sem sair do transe. Aí, quedava em adoração, enquanto a jovem senhora realizava a chamada, entornando o castanho sem-fim de seus olhos sobre o verde-pálido da folha de freqüência. Nome por nome - “Fulano... Beltrano... Sicrano...” - envolvido num sotaque não se sabe de onde, chiado nos dês e nos esses, circunflexo nos agudos, que maravilha.

As meninas, em floração, fantasiavam ser do mesmo jeito. Inveja benfazeja em relação a uma deusa em carne, osso e sedução. Cochichando em bilhetes libidinosos que, fileira a fileira, alcançavam cada quadrante do ambiente, os meninos exclamavam: “Que lábios! Que voz! Que pele! Que coooorrrpo! Que aula!”. Choque de luz nos sentidos das criaturas, nublados por violentos bombardeios de hormônios.

Errado dia, nas férias, a mestra-escola partiu. Para onde, sabe lá o destino, esse gênio iconoclasta que subjuga até mesmo as divindades, sem a gentileza de explicações quaisquer. Dizem, mudou-se para o Rio de Janeiro ou São Paulo. Dizem, viram-na num show do Pink Floyd no Camden Tow, Londres. Dizem, voltou para o monte Olimpo, convencida pelos deuses de Homero a ocupar seu lugar de direito.

Penso que ontem, talvez anteontem, possivelmente semana passada. Conversa, isso aconteceu... dia desses. Pronto, combinemos assim, ela voltou dia desses ostentando novo corpo, agora de aparência balzaquiana, dirigido por olhos de Capitu. A voz costurando o velho chiado dos dês e dos esses na antiga circunflexão que perverte os agudos tornou-se levemente rouca, festa para os tímpanos da moçada.

A galera tresvaria em déjà vu, atenta muito mais na boa “tia” do que nas boas lições dela, embora inteligência e beleza incrementem a fórmula do desejo. Será que a dita percebe, como se fosse musa da canção buarqueana, os arroubos desses bandidos invadindo-lhe os ouvidos e as janelas do vestido? Se não os sente, se não se arrepia, besteira, eles seguem a sonhar a sós, porque aluno é criatura renitente.

4 comentários:

Anônimo disse...

Bom Dia ! AMIGO CID ESSA PROFESSORA PARECE SER AQUELA QUE LEVOU O jOÃOZINHO A DIRETORIA VARIAS VEZES.
UM GRANDE ABRAÇO AMIGO CID.

Anônimo disse...

Deve ser a mesma. Hahaha.

Cid

Anônimo disse...

Vim procurar a homenagem aos professores que Maria Odilma falou. Acredito que deva ser esse o texto.
Não sei porque razão, mas me veio a figura da professora "Rosinha" à mente. *risos*
Ótimos textos, como sempre, Cid. Parabéns.

Vânia Furtado
PS: o meu preferido foi o da palestra no hotel Thermas.

Anônimo disse...

Hahaha...

Vânia, essa professora é uma entidade coletiva!

Obrigado pela visita e pelo comentário.

Tudo de bom,

Cid