sábado, 10 de junho de 2023

Isaura Amélia, a imortal

Não foi Isaura quem tomou posse na Academia Norte-Rio-Grandense de Letras. Foi a Academia Norte-Rio-Grandense de Letras quem tomou posse em Isaura. Longe de mim cutucar a imortalidade com lápis curto, até porque muitas pessoas queridas estiveram naquela instituição e outras tantas permanecem nos seus quadros. Desejo apenas enaltecer a grandeza da figura humana que acaba de chegar por lá.

Conheço Isaura Amélia desde sempre, afinal somos primos. Apesar do destroço que a política causou na família, dividindo-nos em três ou quatro bandas, permanecemos – ela, Vingt-un Rosado e eu – unidos pelos laços fraternais da literatura. Aliás, Vingt-un me disse certa vez, com o testemunho dos milhares de autores habitantes da biblioteca dele, uma frase que ficou gravada na memória: “Isaura é gênio da raça”.

De fato, a prima já era imortal muito antes de qualquer láurea, tanto pela produção acadêmica quanto pelo trabalho realizado nas entidades que coordenou. Há marcas indeléveis de sua passagem na Secretária de Cultura de Mossoró, Fundação José Augusto, Fundação de Apoio à Pesquisa e Secretária de Cultura do RN, no incentivo à produção bibliográfica, à música, ao teatro, à história, às artes plásticas, à pesquisa.

Do que me toca especialmente, registro três atos: o convênio com a Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, para microfilmar o acervo do jornal O Mossoroense, de 1872 a 1950; a ideia, em um desses 14 de março, de pintar versos de poetas locais no asfalto, em diversos cruzamentos do centro de Mossoró; e o esforço que fez da cidade uma das primeiras do País a liberar recursos da Aldir Branc, na pandemia.

Foto sem identificação de autor copiada do portal da Ufersa

Ela é por demais generosa. Dá um cabimento danado a mim, que nem valho a palavra que leio, e até pareço ingrato por não participar das coisas para as quais me convida. De uns tempos para cá, as torres de cristal têm me causado impaciência e vertigem. Esse, contudo, não foi o motivo de eu não ter ido à academia saudá-la com pompa e circunstância. Foi a sala de aula, que limita a vida social do professor.

A ausência não significa que não fiquei feliz, que não vibrei com o reconhecimento a Isaura, sucessora de dois tios na arcádia potiguar: Tércio e Vingt-un, terceiro e vigésimo primeiro dos numerados do velho Jerônimo Rosado; sem dizer do primo Carlos Ernani Rosado Soares. Tércio, conheci em livros e por meio de relatos dos mais velhos. Vingt-un e Ernani, carrego a imensa alegria de haver convivido com ambos.

Ainda sobre minhas faltas, devo, desde 2022, um texto sobre o livro Isaura Amélia: coleção de arte. A obra, harmonia perfeita entre verbo e imagem, talvez seja o registro mais amplo das artes plásticas do Estado. São maravilhas reunidas pela autora ao longo de décadas, de gente famosa e de talentos desconhecidos, que, segundo Iaperi Araújo, no prefácio, foram generosamente dadas à Pinacoteca de Mossoró.

O livro merece crônica à parte, exclusiva. Por enquanto, fica aqui às vistas, sobre a mesa de trabalho, como inspiração para outras expressões. Hoje é dia de parabenizar à Academia de Letras por haver tomado posse em Isaura. Se deixarem, essa mulher vai sacudir a poeira dos fardões e revolucionar o casarão da rua Mipibu, aproximando-o dos interiores, das ruas e dos becos onde nasce, vive e pulsa a arte dos mortais.


Nenhum comentário: