sábado, 23 de maio de 2009

Que tal do começo?



Nem sei por onde começar. Permaneço em terras lunares desde a semana passada, com o casal 20, Jonathan e Jenifer Buraco. Ah, o povo mossoroense e sua verve libertária, com seu humor bocageano: o doutor Leo e a enfermeira Silva Buracão soltos na bura-queira, defendendo nossos direitos buraquísticos, ostentando o magnífico slogan “O bu-raco é meu e ninguém tasca”. Ixe!

Além disso, hoje – ontem para efeitos de jornal – é o aniversário de minha mãe. Ela dis-se, e se ela disse não há motivos para se negar, que alcançou as 58 primaveras, “cinco ponto oito”, como diria meu falecido avô, pai da jovem. Tomara, dona Sandra viva pelo menos outro tanto desse, porque “mãe, na sua graça”, puxando aqui por empréstimo a luz drummondiana, “é eternidade”.

Desejo escrever um poema, mas a lira não me ama, não me quer, não me chama de meu amor nem conhece o bom e velho Maria. Será? E eu estou a ver navios, as naus dos so-nhos de Manoel Furtado, vintenas delas, perdido com Ascenso Ferreira nos mares de Oropa, França e Bahia. Ai, a lira! Um sopro de cor nos meus olhos repletos de madru-gada e tudo viria em rimas e versos.

“Às vezes, me sinto muito só. Sem ontem e sem amanhã. Não adianta que haja pessoas em volta de mim. Mesmo as mais queridas. Só se está só ou acompanhado, dentro de si mesmo. Estou muito só hoje. Duas ou três lembranças que me fizeram companhia, des-de segunda-feira, eu já gastei. Não creio que, amanhã, aconteça alguma coisa de me-lhor”. Eis aí Maria, Antônio Maria.

Não, solidão, hoje os bares amanheceram sorrindo e eu acabo de comprar um livro novo de segunda, no qual está escrito que não terei feriado, fim de semana ou outro tipo de folga. É uma das maldições do jornalista, segundo Marcelo Rubens Paiva, que diz isso sem ao menos conhecer Luciano Lellys, repórter fotográfico, capataz de fazenda, agente funerário e assessor de todo mundo.

Sim, comprei também o livro organizado por Marcos Araújo sobre doutor “Cícero, o semeador de fé e justiça”... e pai do Menino Júlio. Sou fã dos dois. Faltam os autógra-fos, de Marcos e do homenageado, para abrilhantar ainda mais a obra. Talvez no próxi-mo veraneio, em Tibau, entre taça e outra de vinho canônico. Agora, pretendo dormir ouvindo as paredes, e talvez sonhar.

sábado, 16 de maio de 2009

NO BURACO - UMA OBRA DE FICÇÃO NADA CIENTÍFICA



Ministério Público – Vamos instaurar procedimento para investigar se os buracos foram licitados de acordo com a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.

Antônio Francisco – A Petrobras sinalizou apoio ao meu livro “O buraco em que a fome mora”.

Anchieta Costa Lima, interpretado por Zé Luiz – Veja, meu caro, estamos aqui, tête-à-tête, face a face, debruçados sobre a letra fria da norma estampada na tez pálida da celulose, o papel, para terçar lanças sobre a ilicitude das cavidades rotundas cunhadas na pavimentação asfáltica de nossa metrópole.

O Homem do Cachimbo – Eu defendo a legalização do buraco.

Marcos Ferreira – Falta agora cada buraco receber o nome de um Rosendo.

Túlio Ratto – Nem usando aquela canoa atômica, impulsionada pelo remo da pachorra, a papanguzada atravessa o rio de crateras.

Leonardo Nogueira – Eu sou terrível, e é bom parar / De desse jeito, me provocar.

Jório Nogueira – É incompetência do Capitão Gomes. Cadê que ele manda guinchar os buracos estacionados em lugar proibido?

Capitão Gomes – O nobre vereador deveria saber que o trânsito está municipalizado e, sendo assim, o Estado não pode guinchar buraco na circunscrição da prefeitura.

Na Usina de Asfalto – Comprei um quilo de asfalto / pra fazer farofa / pra fazer farofafá!

Caio Muniz – A poesia está em toda parte, inclusive no seu buraco.

Capitão Caverna – Simples: a palavra Mos-so-ró traz um buraco em cada sílaba.

Carlos Santos – E assim caminha a humanidade mossoroense, em meio à buraqueira.

Karol Poltergeist – Aleluia, It’s raining man... e nossos buracos ficarão abertos até o fim deste ma-ra-vi-lho-so inverno!

Luís Alves – Velho, a porra do buraco já está enchendo a porra do meu saco!

Claudionor dos Santos – A Câmara, independente sob minha presidência, pode tombar a buraqueira e até tombar na buraqueira, basta o Executivo oficializar o pedido.

Kydelmir Dantas – Se a buraqueira existisse em 1927, Mossoró teria economizado na construção de trincheiras para se defender do bando de Lampião.

Felipe Caetano – E nós poderíamos criar uma homenagem aos combatentes que lutaram em buraco desconhecido.

João Marcelino – Minha parte é montar o “Chuva de Buracos no País de Mossoró”.

Rosalba Ciarlini – Meus irmãos buraquenses!

Erasmo Firmino – Tio Colorau me disse assim: “Você é doido, mexer no buraco dos políticos”.

Gerente de Turismo – Ampliando alguns buracos, chegaremos à China na classe econômica, mas com rapidez.

Laércio Eugênio – Apesar da AIDS, da CNBB e dos buracos, os jovens continuam a transar e gozar sem camisinha.

Nilo Santos – Depois do jornalismo desejoso, nasce em Mossoró o buraco desejoso.

Propaganda da PMM – Tá na cara/ Tá Diferente/ Mossoró, o buraco da gente.

Caby da Costa Lima – Perdi três pares de tamanco, garotinho.

Sandra Rosado – Agora, sim, vocês estão conhecendo o verdadeiro estilo “arrasa-quarteirão”.

Betinho Rosado – E a Justiça ainda quer que eu fique no buraco Democrata.

Dança do buraco – Cada um/ No seu buraco.../ Cada um no seu buraco.

Larissa Rosado – Somente o TSE para cassar os tais buracos.

Francisco Carlos – Não existem buracos. É tudo mentira da oposição.

Guerrinha – Buraco? Neeeero!

Ravengar – Desafio qualquer pessoa a encontrar minha assinatura num buraco sequer.

Otavinho – Fafá, eu gosto de você, Fafá. Você é minha amiga, Fafá, mas eu preciso dizer, Fafá, que meu bairro está magoado porque sua administração, Fafá, rebaixou a Lagoa do Mato para Buraco do Mato.

Prefeita Fafá Rosado – Meu filho, isso não é só em Mossoró não. Mas tem nada não, eu sei que meu filho recebeu dinheiro pra vir dizer isso. Eu conheço de longe.

Acórdão do TRE – A inauguração de buracos não demonstra potencialidade para influir no pleito municipal.

João Buracão – E agora, quem poderá me defender?

Freud – Por favor, não me peça explicações. Eu não sou o Chapolin Colorado.

sábado, 9 de maio de 2009

Amigos de infância



Meu filho, o segundo deles, perguntou-me sobre amigos de infância, com quantos man-tenho ligação. Pensei, repensei, refleti mais ainda e me vi acuado. Não diante da pergun-ta à queima-roupa, sem precedência no diálogo daquela manhã clara de domingo, en-quanto púnhamos os arreios em Manhoso e Bebel para um passeio na Mororó, mas sim pela conclusão desanimadora que me atropelou.

Disse-lhe, um tanto envergonhado, que praticamente não tenho contato com os amigos da infância. Alguns morreram, infelizmente, e os que continuam usufruindo deste imen-so privilégio de viver seguem por caminhos diversificados. Até onde ouço falar, vários se tornaram gente de bem e poucos tropeçaram nas pedras do vício, despencando, por conseguinte, nas sendas da loucura ou do crime.

Sei dessas coisas por um ou por outro que reencontro pelas ruas, nos bares ou em rarís-simos comparecimentos a eventos sociais – tornei-me, como diria o saudoso mestre An-tônio Rosado Maia, “um misantropo”. Há pobres, remediados e ricos. De desempregado a juiz. De humilde a arrogante. Dos que festejam ao reverem velhos camaradas aos ca-pazes de virar a face para não encarar o passado.

Percorri tantos caminhos, fazendo jus à canção, sendo esta “metamorfose ambulante”, mudando de opinião sobre “o que eu nem sei quem sou”. Talvez os amigos das épocas de infância e de juventude permaneçam no lugar de 30 anos atrás, dividindo os mesmos territórios afetivos, e a distância seja culpa minha, pela ânsia régia de amar o longe, a miragem, os abismos, as torrentes e os desertos.

Perdoem-me, então, aqueles dos quais me afastei. Perdoem-me, especialmente, aqueles cujos rostos perdi nas vielas escuras da memória. Agora, enquanto escrevo estas maltraçadas e maltratadas linhas, muitos retornam e, de certo modo, o exercício me comove e me alegra, pois da multidão de personagens do passado, existem apenas dois ou três desencontros reais e, quiçá, insuperáveis.

Tais desacertos, além de tudo, são de outras fases, nada com referência à meninice. O importante, e isto posso dizer olhando nos olhos do meu filho, é que o pai dele construiu uma legião de amigos, agindo com respeito e lealdade. Não importa se nos vemos dia a dia, ano a ano, década a década. O importante é sabermos que, para lá do espaço e do tempo, sobrevive a força encantadora do afeto.