sábado, 28 de agosto de 2010

O deputado



Capitão Caverna provoca, ele gosta, mas não entro nessa. Quer texto sobre as eleições 2010 com foco nos candidatos excêntricos, bizarros, engraçados, incomuns, seja lá qual for a denominação adequada. Menciona o forrozeiro Dagô, o conterrâneo Miguel Mossoró, o senador positivo-operante e o índio que vive de fazer garrafada e simpatia.

A melhor performance, assegura, é a do índio. Também gosto do estilo das penas do cocar, do cachimbo de angico e do som dos tiros, três ou quatro, ouvidos ao final da participação. Lembram uns vinis de faroeste que papai tinha com a foto de Trinity e John Wayne na capa. As músicas, soladas de flauta, eram entrecortadas por estampidos.

Onde estão Super Moura e Xeique Humberto? Pergunta. Consulto os ex-universitários. Habner Weiner, repórter de peso a caminho da magreza cirúrgica, suspeita estarem infiltrados em hostes adversárias, a serviço de Ravengar. Bruno Barreto, editor político, esclarece: a candidatura do Super foi indeferida e o Xeique virou militante governista.

Menciona Tiririca, em São Paulo, cuja plataforma é descrita da seguinte maneira: “O que é que faz um deputado federal? Na realidade eu não sei, mas vote em mim que eu te conto. Vote no Tiririca, pior do que tá não fica”. Lindo! E ao som de uma belíssima paródia do clássico “Florentina, Florentina, Florentina de Jesus...”, ele extrapola a perfeição.

A propósito, ouvi sexta-feira na FM-103, da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (Uern), o exercício de radiodramatológico de título “O deputado”. A peça, que em Mossoró teria outra inspiração, satiriza o tipo de agente público – não os amigos de Caverna – que aterroriza os assessores esfolando a gramática na ânsia do improviso.

sábado, 21 de agosto de 2010

Soneto (ainda) sem título



Ela jura que a lua guarda as chaves
Do perfume das flores de sua alma,
Que as estrelas, embora tão suaves,
Acendem-lhe vulcões na face calma.

Aos sussurros noturnos já responde,
Aos gritos das manhãs se faz de mouca,
Dos apelos do Sol foge e se esconde,
Quando os dias se apagam vira louca.

Um poeta a beijou sem saber nada,
Perdeu-se de mais nunca se encontrar
Depois de a luz romper a madrugada.

Diz-se até que ele vai envelhecer
Sonhando cada noite a encontrar
Para cada manhã a esquecer.

sábado, 7 de agosto de 2010

A nuvem chupando água



Aconteceu numa dessas manhãs em que Tibau parece uma garrafinha de areia colorida trabalhada pelas mãos mágicas de Josefina, com o mar sereno, coqueiros manhosos e o sol avermelhando a tez dos morros seculares.

Nos alpendres, meninos transformavam papel, cola, linha, varetas e retalhos de pano em objetos alados. Cada qual querendo fabricar a melhor pipa, que fosse mais bonita, mais forte e levasse mais alto os sonhos da infância.

Vencer um duelo de pipas era o máximo, era como derrotar exércitos poderosos em batalhas nas quais ninguém se feria, era o triunfo da inocência na guerra em que, recolhidas as armas, ganhadores e perdedores partiam livres de rancor para novas aventuras.

Naquele dia, porém, mal os meninos empinaram as pipas, a brincadeira foi interrompida por um acontecimento estranho, pelo menos para os que ainda não conheciam certos mistérios tibauenses.

Tinha jeito de história de pescador, daquelas contadas por Ananias ou das que as avós inventam em noites de insônia para fazer criança encontrar o sono. No entanto, o fato ocorria de verdade, unindo céu e mar bem antes da linha do horizonte.

Mesmo quem já havia visto o Batatão correr sobre as águas da Barra ou escutado o destacamento de soldados fantasmas fazer evoluções no Morro das Sete Cores assustou-se ao ver uma tromba sair da cara duma nuvem e entrar no oceano.

Mais espantoso foi perceber que a tromba transparente sugava água em frenéticos movimentos aspirais. De repente, o vendaval tangeu a nuvem e a tromba começou a encolher assim que tocou o solo, desaparecendo no firmamento em poucos segundos.

Talvez os meninos de ontem tenham encontrado, na vida adulta, explicações para o que viram, mas naquele tempo prevalecia a ciência de Tidó, de que as nuvens, quando sentem sede, bebem a água do mar.