sábado, 7 de agosto de 2010

A nuvem chupando água



Aconteceu numa dessas manhãs em que Tibau parece uma garrafinha de areia colorida trabalhada pelas mãos mágicas de Josefina, com o mar sereno, coqueiros manhosos e o sol avermelhando a tez dos morros seculares.

Nos alpendres, meninos transformavam papel, cola, linha, varetas e retalhos de pano em objetos alados. Cada qual querendo fabricar a melhor pipa, que fosse mais bonita, mais forte e levasse mais alto os sonhos da infância.

Vencer um duelo de pipas era o máximo, era como derrotar exércitos poderosos em batalhas nas quais ninguém se feria, era o triunfo da inocência na guerra em que, recolhidas as armas, ganhadores e perdedores partiam livres de rancor para novas aventuras.

Naquele dia, porém, mal os meninos empinaram as pipas, a brincadeira foi interrompida por um acontecimento estranho, pelo menos para os que ainda não conheciam certos mistérios tibauenses.

Tinha jeito de história de pescador, daquelas contadas por Ananias ou das que as avós inventam em noites de insônia para fazer criança encontrar o sono. No entanto, o fato ocorria de verdade, unindo céu e mar bem antes da linha do horizonte.

Mesmo quem já havia visto o Batatão correr sobre as águas da Barra ou escutado o destacamento de soldados fantasmas fazer evoluções no Morro das Sete Cores assustou-se ao ver uma tromba sair da cara duma nuvem e entrar no oceano.

Mais espantoso foi perceber que a tromba transparente sugava água em frenéticos movimentos aspirais. De repente, o vendaval tangeu a nuvem e a tromba começou a encolher assim que tocou o solo, desaparecendo no firmamento em poucos segundos.

Talvez os meninos de ontem tenham encontrado, na vida adulta, explicações para o que viram, mas naquele tempo prevalecia a ciência de Tidó, de que as nuvens, quando sentem sede, bebem a água do mar.

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