Voltei
a caminhar nas sombras e a dormir nos becos, a ser o navegador sem farol das
ilhas mal-assombradas que convidam ao mundo grande do poema de Drummond, porque
“meu coração cresce dez metros e explode”.
É
sempre assim: quando não o arrancam do peito e o espancam, e o esmagam sob
plataformas, e o detonam sem pavio, eu próprio o mutilo com as unhas em sessões
intermináveis de autoflagelo.
Faz
escuro sob o Sol e meus sentidos não enxergam aonde ir, se é que haveria
destino capaz de comportar sonhos ornamentados com ametistas no embrulho de papel
amarelado do velho soneto apócrifo.
O fantasma mirando o rosto
eterno
Refletido em retalhos de
memória,
Tentando recompor a própria
história
Pelos cacos do espelho do
inferno.
O livro empoeirado numa
estante,
Ornado com as teias das
aranhas,
Traz poemas latentes nas
entranhas
Do corpo do papel
agonizante.
Flores murchas sedentas de
perfume
Fadadas a morrer em
jardineiras
De túmulos caiados de ciúme.
Todos eles são quem, perdido
em medos,
Oprimido por rugas, por
olheiras,
Deixa o tempo escapar por
entre os dedos.
De
manhã, na penumbra, arrasto com os pés a corrente formada por elos de angústia.
Os tornozelos em carne viva. Os pulsos, também fechados em argolas de aço, não
se erguem à altura do tórax. E a cabeça. A cabeça oprimida por toneladas de
minhocas curva a espinha e mostra o fundo das calças em reconhecimento à
derrota.
De
noite, palmo sequer de visibilidade, o chão esquelético e nu substitui a cama
farta de outrora, onde ninfas e musas, na pele branca da criatura, vestiam-me com
a doce ilusão de criador para, ao fim e ao cabo, abandonarem na sarjeta o
monstro do espelho.
Tento
dormir, mas, antes mesmo da sensação de queda, cães esfomeados me acordam a
mordidas. Na vigília forçada, ofegante, o som de uma gota d’água renitente
arromba-me os ouvidos e o cheiro da cal do travesseiro resseca a mucosa das
narinas.
Quatro
da madrugada. Eis que ouço passos de partida.
Valei-me,
Deus,...
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