sábado, 9 de maio de 2009

Amigos de infância



Meu filho, o segundo deles, perguntou-me sobre amigos de infância, com quantos man-tenho ligação. Pensei, repensei, refleti mais ainda e me vi acuado. Não diante da pergun-ta à queima-roupa, sem precedência no diálogo daquela manhã clara de domingo, en-quanto púnhamos os arreios em Manhoso e Bebel para um passeio na Mororó, mas sim pela conclusão desanimadora que me atropelou.

Disse-lhe, um tanto envergonhado, que praticamente não tenho contato com os amigos da infância. Alguns morreram, infelizmente, e os que continuam usufruindo deste imen-so privilégio de viver seguem por caminhos diversificados. Até onde ouço falar, vários se tornaram gente de bem e poucos tropeçaram nas pedras do vício, despencando, por conseguinte, nas sendas da loucura ou do crime.

Sei dessas coisas por um ou por outro que reencontro pelas ruas, nos bares ou em rarís-simos comparecimentos a eventos sociais – tornei-me, como diria o saudoso mestre An-tônio Rosado Maia, “um misantropo”. Há pobres, remediados e ricos. De desempregado a juiz. De humilde a arrogante. Dos que festejam ao reverem velhos camaradas aos ca-pazes de virar a face para não encarar o passado.

Percorri tantos caminhos, fazendo jus à canção, sendo esta “metamorfose ambulante”, mudando de opinião sobre “o que eu nem sei quem sou”. Talvez os amigos das épocas de infância e de juventude permaneçam no lugar de 30 anos atrás, dividindo os mesmos territórios afetivos, e a distância seja culpa minha, pela ânsia régia de amar o longe, a miragem, os abismos, as torrentes e os desertos.

Perdoem-me, então, aqueles dos quais me afastei. Perdoem-me, especialmente, aqueles cujos rostos perdi nas vielas escuras da memória. Agora, enquanto escrevo estas maltraçadas e maltratadas linhas, muitos retornam e, de certo modo, o exercício me comove e me alegra, pois da multidão de personagens do passado, existem apenas dois ou três desencontros reais e, quiçá, insuperáveis.

Tais desacertos, além de tudo, são de outras fases, nada com referência à meninice. O importante, e isto posso dizer olhando nos olhos do meu filho, é que o pai dele construiu uma legião de amigos, agindo com respeito e lealdade. Não importa se nos vemos dia a dia, ano a ano, década a década. O importante é sabermos que, para lá do espaço e do tempo, sobrevive a força encantadora do afeto.

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