domingo, 2 de abril de 2023

Microconto nº 12

No mercado, às 5h00, cada bêbado ostenta sobre a própria mesa, a própria latinha de cachaça, a própria laranja, a própria solidão. Como fossem ilhas em homens, conversam com amigos tão íntimos que somente eles enxergam e ouvem. Quanta inveja, a minha! Queria um tantinho desse lirismo que faz a ponte entre o ébrio e o louco. Chega o poeta concreto, pede a cerveja que anuncia ser a última de um périplo iniciado ontem. O bardo ainda ameaça cometer uns versos de improviso, mas é dissuadido pela senhora de crucifixo de prata, que bebe algo em uma xícara de asa quebrada. O que será? O velho do cão maltês também comparece. “Vai pedir café”, imagino. Pede conhaque. Duplo, ainda por cima. Deu a hora de chegar.

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