sábado, 8 de agosto de 2009

Nossos intrépidos juízes



Talvez eu seja o jornalista da cidade que mais brigou com juízes de direito. Digo “brigou” no sentido de discordar, civilizadamente e por escrito, de decisões equivocadas, no meu entendimento de leigo. Canindé Queiroz, no auge de suas famosas contendas na Gazeta do Oeste, aconselhou-me a parar. Do mesmo modo, Antônio Rosado Maia e Marcos Araújo, dois brilhantes juristas, além de grandes amigos, tentaram me convencer dos perigos daquele comportamento. Nunca sofri retaliações, mas, segundo afirmam línguas venenosas, a Rede Resistência de Comunicação pagou o pato.

Isso faz muito tempo. A idade, os cabelos brancos, o cansaço, a artrite, a experiência, essas coisas modificam o cabra, transformando-o, quando não em galo de briga, num tremendo frouxo como este pobre coitado que vos escreve, aos barrancos e trancos, ainda tocado, se bem que de leve, pela espirituosidade do uísque da noite anterior. A polêmica, arremedando o bordão humorístico, não me pertence mais. Para dar ideia – esquisito escrever ideia sem acento – a última vez que caí na esparrela de enfrentar magistrados, dois ao mesmo tempo, deve haver para lá de quatro anos.

Gostou da “espirituosidade” do uísque? Aprendi essa curiosa expressão lendo os autos do processo instaurado em 1833, pelo “juiz de paz da Capela de Santa Luzia de Mossoró”, Domingos Oliveira, contra Longino Guilherme de Melo, primeiro mossoroense ordenado padre. O sacerdote respondeu por esfaquear Antonio Basílio de Sousa numa festa de casamento que ele, Longino, acabara de celebrar. A cada testemunha chamada a depor, o meritíssimo perguntava se o reverendo se encontrava “espiritualizado do vinho”. Ótimo, a partir de agora não admito ser rotulado de bêbedo.

Longino, que bebia, namorava na casa paroquial, tentou matar o pai e estuprou a sobrinha, também não se dava com juízes. Mandou até assassinar um deles, o alferes Alexandre de Sousa Rocha, para impedir abertura de processo contra si e seus capangas, por homicídio. O plano falhou, em parte: sobrevivente, o árbitro resolveu fazer vista grossa às traquinagens do padre cangaceiro, sobre o qual há poucos registros, dada a censura imposta pela Igreja. O de maior importância, escrito por Francisco Fausto e impresso em mimeógrafo por Vingt-un Rosado, é coisa raríssima.

Arremato o assunto admitindo que, depois de tanto tempo e de tanta arenga, voltei ao convívio forense na condição de estudante de direito, trazendo na mente a velha e equivocada máxima segundo a qual todo juiz é culpado até prova em contrário. Depois de acompanhar dezenas de casos, mudei a visão sobre nossos intrépidos julgadores. A maioria deles é de pessoas honestas, de boa índole, preocupadas em aprender, em se reciclar e em promover a lei com justiça e respeito ao cidadão, embora a “juizite” persista na mentalidade tacanha de figurinhas imbecilizadas pela toga.

2 comentários:

Lucas disse...

Conheço casos em que um determinado juiz, passou a vida inteira fazendo sentenças. Sem nunca ter feito justiça.

Canto de Página disse...

Infelizmente, isso acontece.

Cid