sábado, 13 de setembro de 2008

A espada de Chambord



Minha mãe é pacifista militante. Abomina armas, sejam de fogo ou brancas, sejam de verdade ou de brinquedo. Seus instrumentos de defesa são coragem desmedida, inteligência vibrante e palavra certeira. Jamais entregaria, portanto, qualquer objeto mortífero nas mãos de um filho, constatação que a transformava em grande suspeita dos seguidos desvios da espada imaginária que tio Jório freqüentemente me enviava de Fortaleza.

Eu ficava danado da vida por ser criança pequena do Rabo da Gata sem independência para empunhar a peça rara que, segundo o remetente, pertencera ao saudoso General Sei Lá das Quantas. O drama se repetia cada vez que meus pais iam à capital cearense, na época em que se tinha Mossoró como a maior cidade alencarina em solo potiguar. Nossa TV era a Verdes Mares, nossas ambições mercantis, o Roncy e a Mesbla.

Ocorre que Jório da Escóssia, figura lindíssima, brincalhão inveterado e, o mais importante, irmão de vó Lourdinha, telefonava, avisando-me: "Cidoca, quando sua mãe chegar por aí, cobre a ela a espada que lhe enviei." Nossa Senhora das Bicicletas! O coração ficava em tempo de explodir a cachola do peito, tanta a ansiedade naquela espera sem fim que sempre terminava em frustração, pois o presente nunca foi entregue ao destinatário.

Mamãe, coitada, sofria horrores, tentando convencer-me de que tudo aquilo não passava de brincadeira de "Jorinho", forma pela qual o trata a esposa, tia Maria Teresa, pessoa igualmente querida. Nada, no entanto, aplacava o mau humor do menino besta que se imaginava gente grande e a quem somente importava a famosa espada do saudoso General Sei Lá das Quantas que o tio-avô enviara, em demonstração de carinho e confiança.

A brincadeira integrou-se às tradições familiares. Mesmo vendo meus cabelos brancos, tio Jório ainda pergunta se me deram seu presente e, de certo modo, já posso dizer que sim. Recebi há pouco, das sagradas mãos de minha mãezinha, uma bela espada de brinquedo, com timbre de Chambord. Partindo dela, não seria de aço, mas tem a nobreza de trazer a infância à boca do estômago e de me arrebatar meia dúzia de lágrimas.

2 comentários:

Anônimo disse...

Cid Augusto:
Não o conheço pessoalmente e permita-me fazer um comnetário sobre seu nome. El Ci foi, também, o codinome de um dos maiores lutadores pela expulsão dos mouros na Espanha, que por lá permaneceram por 700 anos. El Cid, está enterrado abaixo de uma linda catedral m uma pequena cidade espanhola ... é o nome de um lutador que venceu, e assim seguirá.

Anônimo disse...

Valeu, Ana, seu comentário enriquece esta página.

Tudo de bom.

Cid